Páginas

Autopublicar-se é uma possibilidade real, e incrivelmente ao alcance de qualquer um. Basta estar disposto, ter o material e escolher o veíc...

Autopublicar-se é uma possibilidade real, e incrivelmente ao alcance de qualquer um. Basta estar disposto, ter o material e escolher o veículo. Guardar algum dinheiro para bancar uma publicação pode levar alguns anos, exige um certo sacrifício, no entanto, é uma realização que se fixada como meta, pode ser alcançada.

Mas há também a internet, essa velha aliada do quadrinista independente. A quem já arraigou certo público, a internet permite financiamentos coletivos, recurso já comprovadamente responsável por trazer bons resultados a projetos de artistas realmente dispostos de tempo e dedicação para preparar uma boa campanha. Também temos a opção da publicação online, a qual os requisitos mais básicos são a HQ feita e a criação de uma conta em uma das várias plataformas digitas disponíveis - com custos extremamente reduzidos.

 
Embora possa parecer que estamos a dois passos do fim do arco-íris, a autopublicação online também nos coloca à prova. Afinal, nem sempre o autor terá um editor à sua disposição, nem um revisor, colorista, ou mesmo quem faça o trabalho pesado com as ferramentas de edição eletrônica. É, então, que tecnicamente o autor deverá desempenhar todas essas tarefas, e também trazer para si o ônus de sua obra ter os cuidados merecidos.

São necessários muitos anos para se atingir profissionalismo em todos os detalhes do fazer uma HQ. Não é à toa que as editoras - de verdade - dispõem de um ou mais responsáveis para cada etapa de uma publicação - do roteirista, passando pela prancheta do desenhista à última prova digital. Mas também destacam-se os autores que publicam digitalmente, fazendo bonito na internet valendo-se apenas de seus knowhows e habilidades.Vemos trabalhos de real qualidade e seguidos por um público cativo. Dignos de admiração, vamos admitir!

A questão seguinte é o público. Se em meio a centenas de obras, algumas atraem leitores como melado às abelhas, o que dizer de outras ignoradas ainda que seguindo a cartilha direitinho? É uma questão misteriosa, para mim e para pessoas com quem já conversei a respeito. E isso me dá uma fisgada porque também sei onde doem meus calos. Acontece que há uma série de determinantes. Dentre as que já pude perceber estão as temáticas, a linguagem, a comunicação, os traços mais atraentes ( nem sempre os melhores) e questões exclusivamente técnicas, como o formato de leitura para aparelhos mobiles, por exemplo.

Seria o caso de estudos mais profundos, pesquisas e muitas leituras de "cases". O que tomaria um tempo danado. De um jeito que no fim das contas, e com a velocidade como as coisas têm mudado, pode ser capaz de o cenário se transformar antes de surgir a primeira conclusão. Creio que a chave esteja na sincronia com a atualidade, com os autores da vez, sua comunicação e seus maneirismos. Talvez também seja mais proveitoso esquecer o que um dia já nos inspirou e alimentar a imaginação com referências do presente em que vivemos. Não sei, não tenho um norte seguro quanto a essas afirmações, estou bem mais para errar o chute à distância em que me encontro.

O que também não impede ninguém de continuar fazendo suas HQs com seriedade - ainda que antiquadas - e tentar um lugar ao sol, permitindo-se a satisfação de também vender o seu peixe. Isso já algo bastante aplaudível.

A direção para a qual um traço progride sempre parte das referências do artista. Ele persegue o que mais o atrai. Comigo não é diferente. N...

A direção para a qual um traço progride sempre parte das referências do artista. Ele persegue o que mais o atrai. Comigo não é diferente. No momento que encaro minhas próprias produções, vejo que, embora unido às minhas maneiras, há vestígios de muito do que tenho por inspirador.
 
Por esse motivo, acabei revendo meu Influence Map, mapeando com mais cuidado minhas referências e o tornando bem mais enxuto que os anteriores. Seria inevitável fazer isso mais cedo ou mais tarde, pois não sou um poço de influências artísticas como já me imaginei - ao contrário disso, o simplismo fala muito mais por mim.
 
Nos retrovisores de minha vida artística vejo o quão os traços simples e limpos me traziam melhores sensações. Ainda que os desenhos sofisticados e ricos em recursos sensoriais me causassem admiração em um primeiro momento, sempre me senti mais atraído pelas formas simplificadas e de entendimento imediato. Foi assim quando - na adolescência - comecei a reunir referências e estudar o desenho. O que também se revelava em tudo que eu produzia: como em "8 Anos" - minha primeira HQ - e nas muitas folhas soltas de ilustrações, engavetadas uma após a outra, devido à insegurança e timidez de um iniciante.

Meu atual Influence Map não me deixa enganar ninguém: sou caído pela lineart de "Tina" de Maurício de Sousa - falando exclusivamente das publicações entre 1980 e a primeira metade da década de 90. A leveza e a limpeza dos traços de Tina trazem uma agradável sensação de espontaneidade e clareza. Com um evidente poder de síntese, é um traço muito bem resolvido, exemplificando o que considero ideal, autêntico e sem comparações. Abro mão fácil de escorços e posicionamentos de câmera ousados para por em seu lugar a sutileza do traço de Tina e sua linguagem gráfica peculiar.

Seguindo algumas semelhanças temos "Andrea, A Reporter" de Aluir Amâncio, a qual ainda que apresente maiores dinamismos se comparada à Tina, nem por isso deixa de exibir uma arte também bastante agradável e inspiradora. A seguir os quadrinhos eróticos de "Omaha, A Stripper", onde há a habilidade de se fazer mais com menos, com uma arte final belíssima e fluidez notável. Por último, a bela arte de Nausicaa, de Hayo Miyazaki, sobre o qual ainda devo me debruçar para absorver muito mais. Suas aquarelas me fazem querer tentar e dedicar algum tempo a esse recurso.
  
É impossível tentar ocultar de meu traço as artes pelas quais me sinto seduzido. Mas se eu simplesmente as decalcasse, sem sobrepô-las com alguma experiência a mais, tornaria-me um mero imitador. O que eu jamais gostaria ser.