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Mesmo sendo introvertido e talvez me inclinando até à misantropia (e eu não tocarei nesse assunto pois ele é complicado), foi comum na histó...

Mesmo sendo introvertido e talvez me inclinando até à misantropia (e eu não tocarei nesse assunto pois ele é complicado), foi comum na história de minha vida a necessidade por me comunicar. Na primeira metade dos anos 1990, eu mantinha inúmeros contatos Brasil afora através de correspondências escritas à mão. Escrever cartas me fazia muito bem e foi um hábito mantido com frequência até a chegada da internet. Depois deste advento, tornou-se possível a busca por pessoas com objetivos e gostos em comum com extrema rapidez. Comunico-me melhor através da palavra escrita e de imagens. Esses são os terrenos responsáveis por me fazer sentir livre.

É bem assim: utilizo todos os recursos ao meu alcance para trazer do mundo das ideias algo ao material e também ao digital. Ainda que eu esteja fazendo Arte, acima de tudo, para outrens… acredito nela me fazendo conectar também comigo mesmo. Além de experimentar um autoconhecimento intenso, ao tocar alguém de alguma forma quando regurgito esses sinais defeituosos de comunicação, fico muito, mas muito comovido.

Do mesmo jeito, também me encho de emoção quando encontro artistas com os quais me identifico. Torno-me admirador mesmo dos low profiles e outros anônimos. De maneira semelhante, daqueles com êxito em suas jornadas, os quais somam às minhas paixões uma grande euforia. Um sentimento o qual também me propele a querer sempre continuar. Todos esses desenhistas, músicos e escritores criativos, pelos quais sou atraído, fortalecem-me a acreditar que podemos tudo. Seja qual a mídia, estou sempre em comunhão com o que me deixa em estado de graça. Tudo isso é, para mim, de enorme importância, pois bebo dessas fontes sempre ansiando por todos os seus encantos. E elas jamais se esgotam
 
Acompanhado de tais inspirações, a minha prática mais alegre é abrir o Pinterest todos os sábados à tarde, pegar meus sketchbooks, munir-me de meus materiais de desenho e vivenciar momentos inexplicavelmente Mágicos. Não me vejo em outros campos de estudos fora do Desenho e das HQs, eles se alimentam desse lamaçal (no melhor sentido da palavra) de influências onde estou sempre me movendo. Sinto que despertei nessa vida para isso, meus ideais estão claros aqui neste blog, no Tapas, ou lá no Instagram... E, obviamente, nas HQs impressas das quais sinto um imenso orgulho e me fazem extremamente realizado. Elas foram vontades que carreguei até as oportunidades aparecerem. Minha forma de celebrar tudo isso é criando e fazendo o meu melhor na Arte. Essa é minha retribuição.

Até a minha mudança de endereço, em junho de 2021, jamais pensei em uma possível necessidade de transportar tantos objetos e materiais a um ...

Até a minha mudança de endereço, em junho de 2021, jamais pensei em uma possível necessidade de transportar tantos objetos e materiais a um outro espaço. A partir daquele instante, deu-se a minha tomada de consciência de como um local de trabalho influi sobre o Artista. Além do quanto, ao longo do tempo, ocorre uma intensa adaptação do ambiente aos hábitos de seu ocupante. E quando passei a montar a minha nova workspace, enxerguei algumas minúcias sobre os novos ares e das novas inspirações neles presentes. Um bom material para me fazer refletir um pouco.

Minha workspace já foi assim.

Sem deixarmos as etimologias em segundo plano, ao falarmos das atuais “workspaces”, também nos referimos aos ateliês (do francês), estúdios (do latim “estudare”), oficina (também do latim) ou laboratório (do francês "laboratoire")… Outrora locais de aprendizagem - ou cátedras para discursos e ensinos -, bem como ambientes para exposições e pontos para comércio de Artes, também configuram estrategicamente focos de Arte e Artesania, tidos e designados para o labor individual ou coletivo.
 
Leonardo Da Vinci e Michelângelo preferiam circunscrever seus recintos criativos como para fins exclusivos de esforço do trabalho em seu significado mais evidente... Declinaríamos das finalidades Artísticas ao tomar essa definição? Do meu ponto de vista - ou nas posições ocupadas por nós, caso seja você também um Artista -, manter essa ideia nos faria retroceder sobre os nossos vários saberes a respeito da subjetividade da Arte. Quando assim a defendo, dou maior voz ao meus sentimentos, vivências artísticas e experiência de vida.
 
O ambiente mantido, e todo o guardado nele, fala bastante sobre um indivíduo criativo - existe uma narrativa inserida. Cada objeto eleito tem o seu propósito, a disposição de utensílios e móveis também. Portanto, o espaço de trabalho pode tomar contornos místicos e espirituais, consideradas as ideias neles semeadas, as crenças e, também, as transformações físicas. Corroborando com a afirmação do geógrafo sino-americano Yu Fu Tuan, a qual nos diz: “Para o ser humano, a transformação de espaços em lugar, se dá conforme o acréscimo de sentimentos e afetos, onde tudo conta uma história”.
 
Acontece de o ser humano procurar sempre o seu lugar, o seu assentamento no mundo, com o qual se identifica e é acolhido. Memórias, objetos reconhecíveis, utilidades, etc… Tudo influenciará nos seus processos de produção, nessa dimensão íntima que é a workspace de um Artista. E ambos: artistas e seu lugar de produção passam ao pertencimento mútuo, uma união de personalidades onde há afeto e complemento entre as duas partes.
 

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