02/09/2024 - Um a Breve Recapitulação no Tempo - Homem Quieto

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  Quase todas as pessoas, do meio quadrinistico com as quais já conversei, têm pretensões ou envolvimento profundo com a ficção. Na maioria ...

02/09/2024 - Um a Breve Recapitulação no Tempo

 

 

Quase todas as pessoas, do meio quadrinistico com as quais já conversei, têm pretensões ou envolvimento profundo com a ficção. Na maioria das vezes, elas criam personagens, mundos, dentre vários panoramas imaginários. Percebo isso e não é de hoje: vem desde os meus primeiros contatos com essa muito boa gente, ainda nos anos 90. Ao me reunir, aqui mesmo em minha cidade, com os comparsas das HQs, participei de longas conversas a respeito de nossas criações, quase sempre acompanhadas de rabiscos e textos. Eram tempos da Arte literalmente em “preto no branco”, escrita e desenhada no único suporte que acessávamos: o papel. Com isso, testemunhávamos as criações uns dos outros e tínhamos experiências acontecendo face a face, muitas vezes, ao longo de tardes inteiras em rodas de conversas. Naqueles papos, surgiam fanzines e ilustrações em cooperações, além de troca de quadrinhos de bancas e revistas informativas. Nessa verdadeira "fábrica" de ideias, nossas inspirações se uniam e se multiplicavam sem limites - ao menos até um pouco antes de resolvermos arrumar empregos.
 
Na segunda metade dos 90, houve uma intersecção nos encontros entre artistas, indo dos presenciais aos contatos online, junto ao advento da internet e todas as suas espantosas revoluções. Com as raízes ainda se formando, a internet chamava a atenção pelos recursos de imagem e hipertextos, outrora concebidos apenas na Ficção Científica – mesmo com os longos minutos de espera para o carregamento de quantidades mínimas de KBs. As conversações em chats e nos softwares de troca de mensagens enriqueciam ainda mais nossas criações, ao mesmo tempo em que nos colocava em uma procrastinação infindável. Na mesma época, popularizavam-se os softwares como o Photoshop e o Corel Draw, trazendo infinitas possibilidades de manipulação de imagens. O que favorecia a iniciativa de produções editadas de forma independe, justamente em um tempo no qual a grande indústria das HQs recebia o tratamento digital como diferencial inovador a todo o público reunido em torno dessa cultura.
Sob os prós a contras daquela leva de novidades e ideias mil, permaneciam criativos os ignorados quadrinistas, desenhistas e escritores amadores, incompreendidos pelos habitantes de fora daqueles campos. Não por isso deixando de levar suas pastas consigo e nos seus momentos de descanso do cotidiano, criar universos e realidades alternativas, oriundos do cinema, HQs, literatura e da TV. A inquietude diante de uma indústria implacável – também amada – fazia com que seus admiradores se tornassem visionários e ousassem tentar tocar as estrelas com as suas ideias efervescentes. Hoje, pode parecer até ser uma bobagem, mas quem viveu aqueles tempos, sabe o quão inacessível era uma máquina de Offset e o tanto de dispendioso eram seus insumos – resultando na grande intangibilidade de uma publicação autoral. Ainda os mais abastados estavam longe de sequer cogitar a possibilidade de apostar tão alto.
 
Mas a imaginação de um desenhista/quadrinista/roteirista é indomável e a esperança jamais se extingue, menos ainda quando se é jovem. Logo, as histórias não morrem e a Arte Sequencial é cultuada e amada eternamente, seja no canto recluso de uma escrivaninha, ou dentre um bando partilhando uma mesa de bar, servido de algumas cervejas. Estando tanto tempo longe disso, pergunto-me se ainda há espaço para essas conversas. Acho que não, o lero-lero improfícuo das esquinas mais frequentadas da internet infectou os melhores ambientes, indo além dos convívios virtuais. Há exceções, mas não me resta energia para procurar e ir de encontro a novos comportamentos. Estou bastante cansado e por isso prefiro os eventos. Eles são a grande diversão de minha "Era" atual, tornando-se o meu "barato" maior do momento presente. Lá, tudo é possível e estamos livres e desimpedidos para sonhar e enxergar o mundo sob os nossos mais lúdicos pontos de vista.